20/04/15
» LUCIO RENNÓ, presidente da Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan)
» MÔNICA VELLOSO, gerente de Estudos Ambientais da Codeplan
A cada dia torna-se mais evidente que não há como escapar à progressiva limitação das viagens motorizadas. O problema pode e deve ser enfrentado a partir de alguns princípios básicos: seja aproximando os locais de moradia aos locais de trabalho, seja ampliando a participação dos modos coletivos e dos meios não motorizados na matriz de transportes. É necessário, portanto, que sejam levadas a efeito as políticas públicas que fomentem a mudança nos modos de transporte, inserindo no espaço urbano nova infraestrutura de mobilidade comprometida com a melhoria da qualidade de vida. Viabilizar a mudança de atitude, contudo, não é tarefa simples e imediata. Exige atuação coordenada dos governos no sentido de elaborar políticas públicas condizentes com a realidade complexa e preocupante.
Trazer a bicicleta para a pauta das grandes decisões de governo é, pois, alternativa sem retorno. Ela cumpre a agenda positiva das políticas públicas das grandes cidades do mundo. A implantação de projetos cicloviários no Distrito Federal conta com grande oportunidade de sucesso, posto que a topografia é favorável, o clima é bom e os ciclistas ultrapassam 40 mil.
A mudança está em curso. Foram entregues à população 330km de ciclovias em área urbana e 40km em rodovias; implantados aproximadamente 100km de acostamentos cicláveis em diversas localidades; e estão em andamento obras que somam mais 30km. Pode-se afirmar, portanto, que o DF conta hoje com a marca de 500km de vias adequadas ao trânsito de bicicletas. Isto significa dizer que o DF situa-se em terceiro lugar no ranking das cidades do mundo com maior extensão de vias adequadas ao trânsito de bicicletas. Perde somente para Berlim e Nova York ficando à frente de Amsterdã, Paris, Bogotá, Copenhague, Buenos Aires, Rio de Janeiro, Curitiba e São Paulo.
É importante salientar que a construção das ciclovias, muitas vezes vista como antipática medida de segregação, traz consigo indubitável externalidade positiva — os ciclistas, por serem atores vulneráveis no trânsito, são vítimas potenciais de acidentes com morte, situação mitigada com a construção de vias destinadas exclusivamente ao uso das bicicletas. Prova disso é que, nos três últimos anos, o número de mortes em números absolutos foi, aproximadamente, reduzido à metade. Isso sem contar que o número de viagens de bicicleta aumenta a cada dia.
Segundo dados da Codeplan, em 2005, eram 38 mil viagens; em 2007, mais de 51 mil; e, hoje, estima-se em 70 mil. Ou seja, boas políticas públicas não só promovem melhor qualidade de vida, mais saudável, menos poluente e mais eficiente, mas salvam vidas. Certamente, ainda há longo caminho a se seguir a fim de melhorar a política de ciclovias no DF. É preciso ampliar a oferta de bicicletários, melhorar a integração entre os mais diversos modais, ampliar o sistema de bicicletas de aluguel, sanar os defeitos de pavimento e sinalização, entre outros aspectos de absoluta relevância, mas de fácil solução.
Continuar as obras de ciclovia é tarefa que não deve cessar. As microrredes hoje existentes em várias cidades precisam ser ampliadas e ligadas umas às outras para a formação de uma rede integrada. As ciclovias proporcionam via 100% segura para todos, inclusive crianças e idosos, portanto, um dos maiores exemplos de democratização do espaço público. Por outro lado, dentro da visão do compartilhamento, é desejável que implantemos ciclorrotas em vias locais onde o volume de tráfego seja baixo. Criar programas de traffic calming nas nossas cidades, limitando as velocidades em 30km/h, como há muito se faz na Europa, é uma medida de real transformação cultural.
Entretanto, para a adoção dessas medidas, precisamos entender melhor o perfil e as necessidades dos usuários, promover melhorias na sinalização e na padronização, ampliar a fiscalização e, claro, investir maciçamente em programas de educação para o trânsito voltados aos motoristas e aos ciclistas. De toda sorte, as análises iniciais indicam que houve avanços enormes com a adoção dessa política que estimula uma vida com mais qualidade.
Artigo publicado em 18/04/15 – Correio Braziliense – editoria Opinião